Passira

Passira

por Clara Nogueira

28.933 habitantes (população estimada 2019, IBGE)
329.755 Km²
Mata Norte
Localizada ao norte Salgadinho e Limoeiro; sul: Gravatá, Pombos e Bezerros; leste Feira Nova e Glória do Goitá; oeste: Cumaru.
79 Km do Recife

A palavra Passira, para alguns autores, tem raiz na língua tupi-guarani, e significa “acordar suave”; o historiador Sebastião Galvão, no site do IBGE, sugere, por sua vez, outra fonte, que indica que a palavra significaria: “que acaba em ponta de flecha”. No brasão da cidade, porém, foi adotada a frase que revelaria o amanhecer tranquilo do município.

Em 1870, a Igreja de São José foi construída na localidade que viria a ser, em 1982, o povoado de Pedra Tapada, distrito subordinado ao município vizinho: Limoeiro. Passira era o nome da serra próxima a esse povoado (tem cerca de 800m de altura). Depois, somente em 1937, Pedra Tapada passou a ser chamada de Malhada, e, em 1943, foi substituída por Passira. A cidade, no entanto, só foi reconhecida em 1963, deixando então de ser distrito de Limoeiro.

Alguns traços dessa história são vistos em algumas fachadas que ainda carregam suas características originais. Mas a maioria delas estão modificadas, sendo compostas agora por materiais contemporâneos como a cerâmica, assim como por outras técnicas construtivas. O povoado, que passou a ser distrito e depois cidade, permanece em fluxo de crescimento, embora metade da população ainda seja de moradores da área rural.  Ao redor do centro comercial podem ser vistos grandes loteamentos, casas e prédios em fase de construção e/ ou modificação. Nas ruas do centro, na proximidade da Igreja Matriz Nossa Senhora da Conceição, ainda se convive com um tradicional clima interiorano de Pernambuco, em que, no entanto, casas conjugadas, que antes eram moradia, agora cedem ou dividem espaço com o comércio.

Passira foi formada economicamente pelos ciclos da cultura canavieira e do algodão. Hoje, entretanto, é a Pecuária mista e o milho “assim como o feijão, algodão, tomate, pimentão, fava, banana e laranja [que a caracterizam]. Destaque-se, nos últimos anos, o grande crescimento das culturas irrigadas de hortaliças na região de Vertente Seca”. Mesmo com essa atividade econômica em funcionamento, muitos homens de Passira continuam a repetir o ciclo emigratório do século passado quando vão para cidades do Sul/Sudeste para ajudar na colheita, fugindo da falta de empregos e oportunidades na cidade.

Passira detém o título significativo de Terra do Bordado Manual. Logo na entrada da cidade vemos placas que indicam essa relação, indicações também sobre o caminho para chegar ao Centro Comercial e Cultural do Bordado de Passira, além de algumas intervenções nas fachadas e esculturas da cidade em que se manifestam sua ligação com o bordado. Há, no centro, inúmeras lojas de bordados, e de artigos para bordar. Mas “O uso da propaganda de Passira, como a ‘Terra Do Bordado Manual’ ao mesmo tempo que ajuda a reforçar o trabalho manual e o estímulo ao desenvolvimento do trabalho do bordado, esconde uma situação de dependência que favorece a exploração da mão-de-obra tanto pelo comerciante quanto pelo intermediário. No quadro do artesanato brasileiro a exploração, a dependência, a desigualdade e o conflito são os principais problemas detectados nas análises econômicas do modo de produção artesanal (Canclini, 1981)”. Muitas mulheres sobrevivem do trabalho manual que fazem. No centro ou na zona rural há centenas delas que fazem parte do processo do bordado ou mesmo o trabalho todo, mas a etapa da venda é feita pela minoria. Bordam por paixão, ou como único meio de sobrevivência, mas bordam. Bordaram esse título que a cidade possui sentadas em calçadas (hoje bem menos mulheres que outrora), dentro de casa, sós ou em conjunto.

D. Maria Eliete bordando na frente de casa

Nete no seu lugar favorito, fazendo o que gosta

Desde 1986, acontece a Feira de Bordado Manual de Passira. Fomos à 33° feira, que se iniciou com ajuda do prefeito do município à época, mas principalmente pelo esforço de bordadeiras, que viam na feira um norte para venda de seus produtos e vitrine para sua realidade.  A feira se estende pelas ruas de frente à Igreja da Matriz. Hoje, essa feira ocupa um espaço todo coberto e subdividido internamente por stands. Nela, não são vendidos só bordados como na época de outrora, nem somente o bordado manual feito por artesãs. Essas dividem o espaço de venda com os lojistas da cidade, e com o bordado feito à máquina, motivo de grande frustração de parte das mulheres com quem conversamos. Anualmente, a feira acontece e resiste. Outro espaço de venda do bordado na cidade é o Centro Comercial e Cultural do Bordado de Passira. O Centro, por sua vez, é permanente, embora, sofra com a sazonalidade das vendas. Quando estivemos lá, grande parte dos stands estavam fechados, e os que se mantinham abertos pertenciam a artesãs que moravam relativamente próximas a eles. Estas salientaram que tanto fazia passarem duas semanas sem vender nada quanto vender bem em um dia. Outro problema está em que artesãs que possuem stand mas moram na zona rural ficam com dificuldade de locomoção até o Centro. Como Maria da Paz:

Porque assim, eu moro no sítio, e às vezes eu vou. Passo o dia todinho lá e a gente não vê uma pessoa, tais entendendo? aí, eu tando em casa eu tô fazendo uma coisa e outra. Agora, quem mora na rua é bom.

Centro Comercial e Cultural do Bordado de Passira

Segundo o site da Prefeitura da Cidade, há em Passira diversas atrações turísticas, como a Serra da Passira e as festas de Nossa Senhora da Conceição (padroeira da cidade) e de São José, porém do que mais ouvimos falar foi da piscina do Cafundó. Várias artesãs falaram desse lugar como local de divertimento dos moradores de Passira nos fins de semana. Como Viviane:

Vou pra piscina com a minha irmã. No Cafundó, muito boa, viu?! demais. Lugar tranquilo, tem muita árvore pra pessoa tirar foto, sentar, interessante lá. É muita gente, final de semana, sábado, é lotado. Só paga o que consome lá. Já que aqui não tem praia e essas coisas, só tem essa piscina mesmo.

No sábado acontece a Feira Livre de Passira, que se concentra nas ruas próximas ao Mercado Público. É habitual que, quem mora na zona rural, venha ao centro nesse dia para comprar algo que precisa. Lá vende-se de tudo! Chegamos a encontrar lá um personagem que há décadas faz parte do imaginário, do folclore e até do adagiário popular nordestino: o “homem da cobra”, que vende ervas com a esposa e promete curar a um preço acessível todos os males físicos e espirituais. Os dois se instalam próximos ao carro, no qual carregam a mercadoria, além de caixas de cobras para exibir a eficácia dos produtos a atrair um verdadeiro fascínio dos passantes. Sem dúvida, esse é o lugar da feira que mais junta curiosos e clientes.

Quanto à geografia, Passira faz parte da região do semiárido. Por isso, durante o dia há poucas pessoas andando no sol, o que durante o dia vai modificando, uma vez que o calor vai dando lugar a um clima de frio ameno. Assim, somente perto do pôr-do-sol, é possível ver mulheres confortavelmente bordando nas calçadas. Uma delas é Nete:

Eu bordo em casa, eu gosto de bordar na minha calçada, muito! Um dia desses minha menina mandou uma amiga dela ir lá em casa, a menina: “não sei onde é tua casa!” Minha filha disse: “Não tem a rua do posto? Pronto, minha mãe tá bordando na calçada”. Pronto, ponto de referência (ri).


1 Segundo o site da Prefeitura de Passira.
2 Dissertação de mestrado O Universo da Bordadeira Estudo Etnográfico do Bordado em Passira, de Maria Regina M. Batista E. e Silva. Disponível em: https://repositorio.ufpe.br/bitstream/123456789/16973/1/39S586u%20Disserta%C3%A7%C3%A3o.pdf pag.9 1995.
3 Ver narrativa de Maria da Paz.
4 Ver narrativa de Viviane.
5 Ver narrativa de Nete.