Tingimento natural
O Tingimento Natural é um universo de diversas técnicas de extração e aplicação de corantes naturais, encontrados em plantas e minerais, que remetem à culturas milenares, e acompanham a humanidade há milênios. Os corantes naturais em fibras têxteis são utilizados há – pelo menos – 5000 anos, sendo os registros mais antigos de de sua utilização no Egito Antigo e nas Américas, no período pré hispânico.
Com o desenvolvimento da Anilina Sintética, no final do século XIX, os corantes naturais foram sendo substituídos por corantes sintéticos que apresentavam maior escala produtiva e aderência ao modelo industrial de produção têxtil. Entretanto, a partir do momento em que passamos a criticar e refletir a respeito do impacto ambiental da Indústria Têxtil, o resgate das técnicas ancestrais e de menor impacto ambiental vem ganhando força e adeptas.
Tingir com plantas ou minerais exige um processo longo e, até então, artesanal. Consiste em processos de extração, preparação do tecido, mordentação, tingimento e modificadores.
A etapa de Extração do corante pode ser feita a partir de diferentes técnicas, pois cada corante tem características próprias.São oriundos de diversas fontes: vegetais, minerais e animais.
Para o tingimento têxtil vegetal, utilizamos raízes, cascas, folhas, sementes e, algumas poucas vezes, frutas e flores.
Os corantes naturais estão presentes em diversos elementos da natureza e pertencem a diferentes famílias. As famílias determinam seu comportamento e possibilidades, a partir das moléculas que apresentam em suas composições.
Essa variedade de corantes naturais está presente em toda a natureza e são classificados por grupos, uns com mais afinidade com fibras têxteis que outros. Na maioria dos casos, são hidrossolúveis e podem ser extraídos em base de água e cocção. Esses são os Taninos, Flavonoides e Antocianinas.
Entretanto, há outras famílias moleculares que precisam de processos lipossolúveis (solúveis em óleo), ou de fermentação, como é o caso do Índigo, o corante azul presente na família das Anileiras.
Para o Preparo da fibra têxtil que receberá a cor, os processos são a Purga, que consiste em uma limpeza profunda do tecido, fio ou fibra, com a finalidade de retirar impureza e gorduras naturais. E, em seguida, o processo de Mordentação, que utiliza sais metálicos para promover a fixação do corante à fibra de celulose (algodão, linho, viscoses), ou à fibra de proteína (seda e lã).
Sais de baixo impacto ambiental são os mais recomendáveis e utilizados, como o Alúmen de Potássio ou o Sulfato Ferroso.
Já os chamados Modificadores remetem à variações de PH que alteram o brilho e a tonalidade de alguns corantes. Por essa característica de ser mutável, as cores oriundas do tingimento natural, também sobrem variações no ambiente ao decorrer do tempo.
Há diversas técnicas de aplicação além do tingimento têxtil que se utilizam dos mesmos recursos e reações química dos elementos: Impressão Botânica, Estamparia com Mordentes, “Medium Print”, Aquarela e Serigrafia com corantes naturais.
Shibori
As origens do Shibori remontam ao Japão antigo, onde era inicialmente utilizado como uma forma prática de tingir tecidos. O termo “Shibori” deriva da palavra japonesa “shiboru”, que significa apertar ou espremer. Esta técnica envolve o uso de amarrações, dobraduras, costuras e compressões no tecido antes de ser tingido, resultando em padrões distintos e únicos.
Consiste em um conjunto de técnicas aplicadas a tecidos com o auxílio de diferentes ferramentas, proporcionando efeitos visuais que podem ser alcançados por meio de costuras, amarrações, dobraduras e plissados, isolando determinadas áreas do tecido para provocar efeitos na superfície.
“E daí você pode fazer de todas as formas possíveis e imaginárias que prenda essa dobra, você pode torcer esse tecido num cilindro numa peça cilíndrica, você pode costurar essa peça, drapear essa peça, e no local onde a tinta não vai penetrar ela vai fazer esse desenho. O shibori é uma técnica que faz com o que essa imagem, que pode ser bidimensional como uma serigrafia normal ela se torne tridimensional com essa técnica de dobradura. Então é um processo bem complexo, mas que você pode ter de várias formas.”. Nos exemplifica Luciana Queiroga.
Apesar do nome japonês, técnicas similares são encontradas em diversas culturas que habitaram e habitam os territórios do norte da África, China, Índia, Indonésia, Coréia e Américas.
Em cada território, a aplicação das técnicas de Shibori variam de acordo com a associação com outras técnicas e a escolha de cores. Por exemplo, o uso do índigo no Japão, a associação do Patchwork na África e as cores fortes associadas ao bordado na índia.
As técnicas de Shibori são derivadas de dois processos: Arashi – amarrações – e Itajime – dobraduras. Ambas se utilizam dos processos de isolamento de parte da superfície têxtil e imersão em água.
Os processos de Arashi podem utilizar diversos suporte, como cilindros, esferas, argolas e alinhavo. E os processos de Itagime, podemos utilizar materiais resistentes à água, que não deformem durante o processo.
Isolar uma parte da superfície têxtil consiste em torná-la inacessível ao corante no meio aquoso, se utilizando de pressão ou amarrações.
A intensidade de força e habilidade para configurar as áreas isoladas podem ser aprimoradas com a prática, mas também são pessoais, pois dependem da força aplicada e do estilo de cada artesã, como cita Luciana Queiroga:
“Eu tive o start técnico por uma artista plástica que já não é esse shibori tradicional, porque ela já imprimia de uma outra forma o Shibori dela, né?
Eu pude ver que eu podia criar em cima dessa técnica, que não é a minha história, né? Mas que eu posso transformar na minha história, é uma técnica japonesa e que eu posso trazer pro nordeste e virar um shibori Luciana, da Olívia Shibori, que é isso que a gente faz.”
Devem ser tomados alguns cuidados, como conhecer a procedência das fibras, para a combinação adequada de materiais e o planejamento do local das aplicações.
Solte sua criatividade, reaproveite e traga personalidade para os objetos que nos cercam.
Os cuidados necessários são: adequação do material têxtil ao corante e técnica utilizadas, controle da temperatura e planejamento do local da aplicação, para garantir coerência com resultado esperado.
Contudo, o processo de experimentação com o shibori é também um processo de desapego do controle do resultado, afinal, por meio de dobraduras e amarrações, somente ao final, quando o tecido é aberto, que se revela a superfície.
”O que eu acho que mais me emocionou no início dos meus trabalhos, quando eu abri os meus trabalhos, é a falta de controle. E, eu chorava por dois motivos: eu chorava nos primeiros tecidos, eu choro até hoje dependendo do resultado, mas os primeiros, primeiro eu não esperava que eu conseguisse fazer aquilo, né? Que é uma luta eterna, uma coisa que eu nunca tinha feito na vida, uma mulher de cinquenta anos de idade que nunca tinha feito aquilo e de repente eu resolvi… E ai, quando sai eu falo “gente eu nunca pensei que eu seria capaz desse tipo de coisa. Primeiro é essa emoção, e segundo é a falta de controle. Quando dava errado, e aí eu olhava e dizia “gente eu não consigo controlar o pano, a tinta”.
Luciana Queiroga
Além de sua beleza, o Shibori também ressoa com uma crescente conscientização sobre a sustentabilidade e a valorização do trabalho artesanal. Ao optar por técnicas de tingimento manual em vez de métodos industriais, os praticantes do Shibori contribuem para a preservação das tradições artesanais e para a redução do impacto ambiental da indústria têxtil.