Albanita, 89 anos

Albanita

D. Albanita bordou durante quase toda sua vida estandartes de carnaval. Com a sua alegria também de foliã ensinou ao seu neto e ele e seu companheiro seguem esse grande legado.

Conhecemos o trabalho de D. Albanita pesquisando sobre estandartes de carnaval. Achamos uma postagem do Bloco Pitombeira dos Quatro Cantos falando do trabalho dela na confecção de seus estandartes. Fomos pesquisando e ao chegar no Instagram, administrado pelo seu neto José Henrique e seu companheiro Ivan (a quem D. Albanita o chama de neto também), marcamos uma entrevista no começo de 2022, mas não foi possível fazer. Então, voltamos ao contato cerca de um ano depois. Ela e seus netos nos receberam com alegria e disposição. O que não sabíamos é que seus trabalhos e seus estandartes já tinham cruzado tantas vezes conosco nas ladeiras de Olinda. Foi em sua casa, em Rio Doce, que conversamos e ela nos contou um pouco sobre sua vida, e que vida!

(conversa realizada em dezembro de 2023)

Narrativa

a menina do presidente

Eu declamei uma poesia muito comprida e era menina de nove anos, aí fui instruída pra declamar a poesia. Me lembro como se fosse hoje, um [homem] olhou para os outros, aí eles silenciaram… quando eu terminei a poesia, Getúlio Vargas disse assim: “olhe, eu quero lhe dar um presente, se eu for pedir pra você dizer eu tenho certeza que você vai dizer: uma boneca, mas eu quero lhe dar outra coisa, não vou dizer agora”.

Pronto, com um mês eu recebi uma carta, em casa, dele dizendo que eu estava autorizada a se matricular na Academia Santa Gertrudes [escola em Olinda], na condição que eu quisesse, interna, externa ou semi-interna. Eu fui chamada durante o curso todinho “a menina do presidente”. Ninguém bulia comigo não [ri]. Passei oito anos [na Academia]. Foi um presente, né? Agora quando chegou no último ano do pedagógico, eu fui a única aluna que recebeu o diploma registrado, pedagógico. E quando eu chegava pra fazer concurso aí diziam “estudou aonde?” eu dizia “Academia Santa Gertrudes”, [respondiam] “não precisa fazer concurso não”.

embaixo de um bastidor

Albanita: Eu acho que eu nasci embaixo de um bastidor [ri]. Desde pequena, nove anos eu já comecei a fazer .estandarte A minha tia, Anita Batista de Oliveira [fazia]. Eu gostava [de carnaval], eu acho que pra fazer estandarte tem que gostar de carnaval, porque você transmite o seu bem estar, você transmite através da agulha.

Eu bordo, todo tipo de bordado eu faço. Bordado branco em linho, bordado cheio, for bordado eu faço e depois eu passei para o estandarte. [Aprendi] com a minha tia [Anita].

José Henrique (neto): Maria do Monte era a madrinha [de Dona Albanita] e também teve essa questão toda de estandarte e de bordado, ficou bem conhecida em Olinda também. Maria do Monte Marques Buriti, o nome dela.

Albanita: A minha tia Anita, ela montou um ateliê e ensinava bordado. Ela chegou a ter no ateliê trinta alunas. Bordado de enxovais que iam para exposição. Nessa época ia pra Viana Leal, aqueles estandartes bordados.

José Henrique: Era [um ateliê de] estandartes e enxovais, naquela época ela pegava vestidos de noiva, vestidos de madrinha, o povo procurava muito ela pra fazer e chegava vestido e roupa do Senhor dos Passos, da Igreja Católica. Mantos, Nossa Senhora ela [Dona Albanita] fazia o manto, bordado com ouro, ou sem ouro mesmo.

Doze badaladas

Albanita: A minha tia [Anita] era muito exigente, eu tinha hora pra chegar e tinha as obrigações em casa. Eu podia ter a empregada que tivesse, mas quem tinha que botar a mesa do almoço era eu. Aí eu ficava no colégio, estudava no Santa Gertrudes, aí ficava lá conversando [ri], menina, quando Olinda dava… a Igreja dava doze badaladas, quando ela dava a primeira eu começava a carreira, quando ela dava a última eu chegava em casa [ri]. A Ladeira da Misericórdia, eu desci não sei como eu não quebrava as pernas. [ri bastante].

Estandarte

Albanita: Tem estandarte de clube, troça, maracatu, todo tipo, se reuniu, quis fazer o estandarte, faz! [A função do estandarte] é abrilhantar a agremiação, representar.

José Henrique: Em relação aos desenhos, ela sempre desenhou perfeitamente, né? ela diz assim “ele cria mais”, em relação a que ela sempre me pedia, mesmo [eu] pequeno, ela sempre me pedia uma opinião de uma coisa ou outra. E eu sempre gostei muito também, então eu dava alguns palpites, mas hoje de fato, quem desenha é ele [aponta para Ivanildo, Ivan, seu marido] que ele tem uma mão muito boa para desenho e ele cria as plantas todas.

Mas em relação ao desenho mesmo era ela [a avó, Dona Albanita] e ela ampliava na mesa, não tinha essa questão de copiadora, de computador, então ela ampliava com régua na mesa, numerado, quadradinho por quadradinho, ela fazia num tamanho de folha ofício e ampliava pro tamanho original em casa mesmo com a régua.

Albanita: Por alto assim eu já fiz uns 50 estandartes de clube. Porque eu faço assim, pra Pitombeira eu já fiz cinco. Lenhadores, Elefante. Caldeirão, Só vai quem chupa, tem Girafas, Netinhos de vovô Hortêncio, Ceroula, O Fazendão, Vai e vem do Bonfim, Acorda pra tomar Gagau, Lenhadores…[José Henrique: Bola de Ouro ela também fez, Camburão da Alegria, As virgens de Bairro Novo, Loucas de Pedra [da Pedragon], América Forte, O César lá de Recife].

Carregando um mini estandarte

José Henrique: [ela fez o] Estandarte “garotos da vovó” e me fantasiava de porta-estandartes, fazia as perucas.

Eu desde sempre ela que me puxava [ para o Carnaval], então tipo, o restante da família saiam e iam brincar em outro canto, mas eu tava com ela e eu ia com ela e ela me levava, ia pras Virgens, levava uma marmitinha com lanche já, sanduíche natural, ela preparava coxinha, a gente ia pra um cantinho e assistia a passagem dos blocos, se fosse agremiação ou alguma coisa que ela tivesse feito estandarte, ou eu participava como porta estandarte carregando o mini [estandarte] do clube, ela botava e eu desfilava. Então sempre… a gente respirou o carnaval o tempo todo. A gente já morou em Olinda no Centro Histórico, na Rua do Sol.
Albanita: Na Prudente de Moraes também.
José Henrique: Na Prudente de Moraes ela morou numa casa antes de mim, eu não era nascido não. A gente morou juntos na Rua do Sol.

trabalho que já veio a história da minha vó

José Henrique: Falando por mim, é muito especial, é muito gratificante porque a gente vive o carnaval, mora muito perto do carnaval. Sempre a vida toda, sempre participei muito de carnaval, nas Virgens a gente se fantasia, vai desfilar. Então a gente chegar, fazer um trabalho que já veio a história da minha vó, que passou pro meu companheiro e a gente dá de cara na rua e vê aquilo ali arrastando multidões é muito satisfatório, muito prazeroso.
Ivan: [a função de um estandarte] É dizer “oi, estou aqui, tô abrindo pra meu bloco passar”

Ele vem trazendo o bloco ali, a história do bloco ali, a marca, ele vem abrindo, ele vem puxando todo o desfile ali.

Estandarte para casamento

José Henrique: O primeiro que a gente fez sozinho, nós dois [ele e Ivan], foi na pandemia. [Para] um casamento na Pousada do Amparo e desceram nas ladeiras com o estandarte, quando a gente viu aquilo, eu e ele, ficamos bem emocionados mesmo.”Meu Deus do céu, a gente tá fazendo o que vovó fazia e tão gostando e a alegria do povo na rua era muito bom”

É uma novidade agora que da pandemia pra cá, a gente já tinha feito um [estandarte para casamento, com o nome dos noivos]. É uma ideia muito boa, muito original. Porque aquela cerimônia clássica e o pessoal deu uma quebrada… tanto com dj, balada e essas coisas, tanto botando um estandarte ali, quem gosta de carnaval.

[no primeiro] Trouxeram uma pintura, sem moldura, de última hora, e pediram pra gente dar um jeito de transformar no estandarte.

Ivan [marido de José Henrique]: Então a gente pegou um estandarte, fez e aplicou a pintura no meio, fez um bordado ao redor..

Albanita: Era uma pintura de uma noiva caminhando, de costas, um casal.

José Henrique: Aí passou um tempo, e aí não pediram mais… Aí agora tão pedindo, empresa tá pedindo com a logomarca da empresa, aniversário, bodas de ouro.
E dura muito tempo, quase a vida toda.

Albanita: E todo a mão.

José Henrique: Até hoje todo a mão. O pessoal pergunta “rapaz, não tem como tirar alguma parte do trabalho de vocês, tirar do manual pra poder vocês pegarem mais [trabalhos]?”. A gente nem quer fazer isso, e nem tem como, porque se você prestar a atenção em todas as partes que tem no estandarte é muito importante, então não tem nem como a gente fazer na máquina.

Albanita: [o que acha deles estarem fazendo?] Maravilhoso. Talvez seja isso que eu ainda sinto, eu não poder passar tudo que eu sei, porque se eu for passar tudo que eu sei é muito tempo.

Ivan : ela que me ensinou, me deu essa profissão. ela me adotou.

José Henrique: Eu fui criado por ela desde o início. A vida toda pra onde ia eu tava, até hoje. A gente se conheceu brincando carnaval e ela abraçou completamente. E quis que a gente casasse mas que não morasse longe, [quis] que a gente morasse na mesma casa. E hoje tá os três juntos que aqui é um pelo outro.

Albanita: Aqui é raíz da família.

José Henrique:Tanto que na logomarca da gente a gente quis botar, o símbolo colocou: dua agulhas que seriam nós dois e uma linha passando pelas duas agulhas, que seria ela que deu o nó na gente.

Albanita: Quando eu faço qualquer escritura eu faço “meus netos”, esse aqui [apontando pra JH] não é neto, é um neto-filho.

Encomendas

Ivan: [para encomendas] Geralmente a gente pede o nome do bloco, se o bloco já tem alguma arte. A gente procura saber quais os elementos, cores, características. Ou o que ele quer representar de fato no meio do estandarte dele. A Pitombeira, o clássico da Pitombeira, é os Quatro Cantos de Olinda, que era pintado à mão por ela [Dona Albanita]. Então os estandartes dela é mais clássico ainda por ela ser todo feito a mão, inclusive a arte do meio do dela ela fazia a mão, pintadinho, ela desenhava, depois pintava e aí ficava aquela perfeição.

José Henrique: E é agora o que ele [se referindo a Ivan] está tentado pra colocar em prática. Pra ficar totalmente artesanal, porque hoje em dia fica mais difícil de a gente ter essa prática de fazer, porque ela fazia muito bem e aí a gente sa muito estampa, vai na malharia, pede pra fazer do tamanho que quer a logomarca que eles [pessoas eque estão encomendando] mandam. Mandam tudo pela internet e a gente dá início. A gente prepara a planta e a gente tenta fazer com o máximo de exclusividade, nunca repetir nada.

Albanita: Existe agremiação como a Pitombeira que repete a planta, porque tem que ter o principal no Centro, Olinda né? Os Quatro Cantos, dois cachos de pitomba, a harpa, o sol.

José Henrique:Eles [Pitombeira] têm esses elementos aí, já registrado, pra ninguém ficar usando igual ou armar da mesma forma.
[sobre os ornamentos dos estandartes] Dependem muito do que pedem, né? mas no tradicional a gente usa muita lantejoula, o pessoal pede muito, com muito brilho.

Dona Albanita: Galão dourado

José Henrique: Fios, pedrarias…

Dona Albanita: e ouro!

José Henrique:Fio de ouro, a gente até tem ainda que eu guardo pra se um dia a gente quiser usar. Nem eu nem ele [Ivan] consegue fazer trabalho com fio de ouro de jeito nenhum, é muito minucioso e ela fazia [Dona Albanita], minha mãe aprendeu e uma amiga nossa, ela também aprendeu e fazia muito rápido também, mas eu não.
Tem a questão também que um não quer imitar nada do outro,né? A gente já fez estandartes de dois clubes que eram meio rivais, então tipo, quando vinha mostrar um serviço a um cobria o do outro, porque o outro não podia ver.

Ivan: Isso se mantém até hoje, a gente enquanto um estandarte não tá pronto a gente costuma não deixar ninguém tá olhando, até porque como vovó tava dizendo, né? a gente tem que tá bem de uma certa forma pra poder bordar e tudo ficar no seu lugarzinho ali perfeito, então a gente prefere que só vejam o trabalho impecável, pronto, finalizado.

Eu fazia estandarte o ano todo

Albanita: Eu fazia estandarte o ano todo, porque tinha vezes que fazia Pitombeira, Elefante… aí juntava muito estandarte. Eu passava uma média de três meses fazendo um.

Ivan: E teve uma fase que de fato era mais ela que trabalhava, ele [José Henrique] era mais o suporte do que precisava da rua, comprar um material ele ia na cidade e aí ele fazia… Ele ficava na responsabilidade das peças bordadas em lantejoula e de fato aí [se referindo a Albanita e José Henrique] é carne e unha, aí por isso ela levava um tempo a mais pra confeccionar sozinha, ela tinha que bordar os dois lados do estandarte.

José Henrique: Mas ela também fazia muito cerão “eu vou fazer cerão hoje” então dormia um pouco à tarde, depois do almoço, acordava umas cinco horas da tarde, jantava, assistia uma novelinha e depois ia pro estandarte. E aí, ela passava a noite inteira e quando eu acordava já tava o meio do estandarte quase todo montado já, todo pronto.
Ela gostava muito, ficar de madrugada, sozinha, ficava pela casa bordando, a gente tudo dormindo e ela bordando e quando a gente acordava já tava bem adiantado, ela dizia “olhe, isso aqui é pra você fazer, você borda muito rápido lantejoula”… aí a gente passava o dia bordando.
Algumas pessoas próximas, bem amigos da gente, dela, aprenderam também, aí quando tinha muito trabalho a gente chamava e distribuía os serviços. Aí dava a hora do almoço eu ia pra cozinha, eu sempre gostei muito de cozinhar, eu ia pra cozinha pra fazer o almoço e todo mundo parava, almoçava, conversava, ria, botava a fofoca em dia também e depois voltava de novo.

Pitombeira tiro em primeiro lugar

[Bloco do coração] Pitombeira tiro em primeiro lugar, em segundo vem Elefante, e Girafas… vai seguindo assim. Lenhadores.

[Homenagem da Pitombeira] Foi feita assim, eu nem sabia, quando eu botei o pé [na sede da Pitombeira] tocaram clarins… [a senhora gostou?] demais!, eu sou vaidosa.

José Henrique: Ela brincava, desfilava na Pitombeira, assim, acompanhava o bloco na rua com os amigos, ela contava as histórias pra gente, as armações dela que ela fazia… que era vaso sanitário com ameixa dentro e passava na boca do pessoal. Tudo acompanhando na Pitombeira.

Albanita: Eu fazia doce de ameixa, comprava uma bacia sanitária, botava o doce de ameixa numa bacia, melava todinha e botava a bacia em cima de um jipe, aí o pessoal se assombrava né? quando eu passava a mão na bacia [ri muito].
Tomava batida, bebia… eu vivi.

José Henrique: Morou na frente do [Clube] Internacional [emRecife].

Albanita: Eu dizia quando tocavam o primeiro bombo eu tava lá [ri]. Brincava os três dias de Carnaval, um dia no Internacional, no outro dia no Náutico e no outro no [clube] Português.

Lenhadores foi quem escancarou ela em Olinda

José Henrique: Lenhadores cedeu um espaço muito bom pra ela, numa fase um pouco difícil pra gente, em relação a alguns parentes, e aí Lenhadores foi quem escancarou ela em Olinda. Porque o pessoal conhecia muito ela por conta da tradição da família [de fazer estandarte], mas era assim um trabalho ou outro que aparecia. Quando a gente veio aqui pra Olinda mesmo de novo, pro Centro [Histórico] de Olinda mesmo a gente morou perto do Lenhadores. Então a Rua do Sol tem uma rua transversal a outra é Lenhadores e a gente conhecia, foi vizinho do presidente do Clube, e aí pronto, ele abraçou e abriu o Clube.
A gente fazia quatro estandartes, montava quatro estandartes no clube, a família todinha, minha mãe e outras amigas que a gente considera da família também participavam e eu pequeno ajudava em algumas coisas de colagem, mas de bordado não.

Aí expandiu… foi estandarte pra Brasília, pro Governo, foi estandarte pra França, pra Portugal, ela fez muito estandarte.

Clube das Pás

José Henrique: Aí foi quando veio o estandarte do Clube das Pás, que tinham dois da família [já feitos anteriormente pela família], mas ela nunca tinha feito [sozinha] e o pessoal queria que ela fizesse. E era em ouro, bonecas de porcelana, máscaras de Veneza que trouxeram pra botar e foi um estandarte que ficou uma coisa inacreditável, ta lá até hoje [no Clube das Pás].

Albanita: O do Clube das Pás tem uma boneca que o cabelo é da minha tia. A gente fez a peruca.

José Henrique: Foi o do primeiro [estandarte que a família fez pro Clube das Pás]. Quando ela fez [a tia avó Anita], ela mesmo fez tirou do cabelo dela e botou na boneca, que é um anjo. Aí, depois quando veio pra ela [pra Dona Albanita], ela tirou [o cabelo da boneca] mandou pro salão [de cabeleireiros],mandou lavar, com maior cuidado, fez tudo de novo, fez o penteado todo na boneca, que era de porcelana e montou tudo de novo e botou no estandarte novo [feito por Dona Albanita].

Albanita: Eu procuro botar em alto relevo [alguns adornos do Estandarte]. Por exemplo, querem uma boneca, eu quero uma boneca [de verdade], aquela boneca fica em alto relevo, visto ela, e aplico, ela fica voando.

A coisa mais alegre é quando um estandarte lhe cumprimenta

Albanita: Quer saber qual minha maior alegria? era: eu fazia o estandarte e ia pra saída [do Bloco]. A coisa mais alegre é quando um estandarte lhe cumprimenta. Agora deixou né? Porque eu deixei de frequentar, né? porque não tenho condições, mas todo estandarte passava pra me cumprimentar.

José Henrique: Tem os porta-estandartes bem antigos, principalmente o da Pitombeira, que já conhecem ela, que até hoje estão lá.. e quando vê ela já… na homenagem [que a Pitombeira fez pra ela] a gente tava chegando ainda e foi lá, baixou o estandarte e reverenciando ela.
Albanita: É… bota o emocional, você em pé e vê um estandarte de quase dois metros ir até o chão pra lhe cumprimentar… e pesado [o estandarte].

Principalmente o da Pitombeira que eles pedem pra gente botar mais peso dentro, e a gente coloca umas madeiras também… que eles gostam com peso pra dançar.

Albanita: Se for muito leve eles mandam botar peso.

O Clube das Pás, no dia que eu entreguei [o estandarte] foi emocionante, porque eles se fantasiaram com damas de frente, tudo. Quando toca um clarim você se choca. Aí fizeram uma carreata.

José Henrique: Dos Lenhadores de Olinda até o Clube das Pás [em Recife], e a gente em cima do caminhão, com estandarte montado em cima do caminhão e bolas, festa rolando até chegar no Clube, porque eles são bem tradicionais. Fizeram tudo do mesmo jeito que fizeram com o primeiro [estandarte] da tia dela [Anita]. Ela faleceu faz muito tempo, eu não era nem nascido quando ela faleceu.

[Anita] foi ficando conhecida, né? porque elas moraram nessa época das tias, elas viviam ali no foco de Olinda, que era na Prudente de Moraes e no Amparo que elas moraram. Ela [Albanita] estudou no Santa Gertrudes, então tem toda uma história dela ali por cima, o pessoal antigo. Até hoje quando a gente vai e passa com ela tem umas senhoras bem antigas e ela “Olha fulana…não sei o quê”… e falam, eram da mesma idade.

Albanita: [o primeiro estandarte que fez sozinha, sem a tia Anita] Foi o da Pitombeira.

José Henrique: Foi em 1996. A gente morava até em Beberibe, no Recife. E depois disso o pessoal falou “a senhora tem que ir pra Olinda” e aconteceu uns problemas que de fato a gente foi pra Olinda e morou em Olinda e começou tudo dali.

Barreiros

Ivan: É que ela tem esse respeito aqui em Olinda e em Barreiros também ela tem esse respeito muito grande por conta do bordado e porque ela era assistente social.

José Henrique: Até hoje vem um grupo de pessoas…

Ivan: de Barreiros que vem visitar ela. Por toda dedicação que ela teve, porque ela ajudou muita gente. Até na Usina de Barreiros ela revolucionou lá.

Albanita: Em Barreiros eu fundei uma escola de samba “Nota 10”, entrava fantasia. Fiz o estandarte.

Assistente Social

Albanita: Eu trabalhava no INCRA. Eu fiz concurso do INRA, que era o Instituto Nacional de Reforma Agrária, passei depois para o IBRA Instituto Brasileiro de Reforma Agrária e depois passei para o INCRA, tudo numa repartição só. [Se aposentou lá?] Foi.

José Henrique: E fez um estandarte pra Repartição. Movimentou o pessoal, eu lembro mas eu era pequeno. Ela movimentando todo mundo “vamos fazer um bloco?”. O pessoal se animou e todo mundo fez, ela fez o estandarte, fizeram uma festa e daí em diante ficou, todos fizeram uma festa. Todo ano eles faziam uma festa na Repartição deles.

é tudo em alto relevo

Ivan: De Recife tem o “Acorda pra tomar gagau” que os estandartes são dela. São franjas de canutilho, outro trabalho que ela nos ensinou com muita delicadeza pra fazer uma franja de canutilho, um por um, fio por fio…

Do Lenhadores é o que tem ouro, ela criou toda aquela planta, que foi o estandarte que foi pra Brasília, pro Governo, que foi um vermelho, aí o clube pediu pra ela fazer a mesma planta só que azul pra eles. Aí o letreiro todinho é em ouro e é tudo desenhado a mão.

Albanita: Eu botei assim “Pernambuco” e é tudo em alto relevo, você olha assim pensa que tá caindo. Por exemplo, o “Acorda pra tomar gagau” no centro [do estandarte] era uma mamadeira, o folião encostado na mamadeira [ri] e uma mamadeira.[que é uma caneca de chopp a mamadeira, e ela pintou tudo a mão]

Onde você for tem estandarte meu

Ivan: Já teve gente que fez com ela pode outros Estados, de outros países também. Às vezes vinham pessoas de outros países que se encantavam tanto com o estandarte que eles queriam levar um estandarte com eles então eles terminavam encomendando a vovó.

Ela também fazia miniatura, tanto pros clubes que eles pediam pra entregar de troféu quanto pra algum evento, alguma coisa, ou empresa pedia pra colocar logomarca, clubes [de futebol] Sport, Santa [Cruz].

Albanita: A miniatura é um trabalho tão minucioso, tão trabalhosa…

José Henrique: Fez capa de Maracatu, capa de caboclo de lança. Eles fizeram estandarte tipo uma gola dessas, tudo preenchido.

Ela trabalhava de segunda a sexta.

Pode botar no fim da entrevista: "ela viveu"

Albanita: Eu tenho 4 filhos, 13 netos e 3 bisnetas.

Pode botar no fim da entrevista: “ela viveu”, porque eu vivi, por isso que hoje eu sou uma pessoa que não tem condições, sou cadeirante, mas não morre de desgosto por isso não.

Mas a velhice ela vem, tem que vir pra todo mundo, ou morre ou fica velho, não tem outro caminho não, mas se você viveu, você atravessa na velhice tranquila.

José Henrique: Ela sempre frisou isso pra gente “viaje” “viva” “brinque o carnaval” “vivam mesmo”.