Genelícia passa seus dias trabalhando dividida entre a roça e a renda. Aprendeu ainda menina e ensinou aos filhos tudo que sabia sobre os dois. Conversou conosco em sua casa, no sítio Gangorra.
Por Luíza Maretto
Nos sítios, nos cantos com terra pra plantar, procuramos mulher rendeira. Tem alguma? Tem sim. Tem várias e tem Dona Genelicia. Quando a encontramos ela está na casa de seu filho, com sua almofada de renascença no colo.
Pra conversar, num dia de chuva, na sala da casa dela, estamos acompanhadas, primeiro com uma filha. Depois entra a outra, que é sua vizinha. Depois o outro filho chega também. E por ai vai… Frio lá fora e Dona Genelicia com a pele quente, dentro, tranquila. Suas mãos se esfregam uma na outra, suaves, em muitos momentos. Suas mãos, casas da terra, da agulha, da linha. Ela pega o saber, planta a semente, colhe o que ela mesma plantou e alimenta seus muitos filhos e filhas. Educa, dá o que comer. Suas mãos apalpam sentidos, a vida e, assim, fazendo, ensinam. Genelicia ensina seus filhos e filhas a fazer, cada um por si, o seu próprio caminho. Criou, em casa, sua vida, e cuidou de ensinar a viver muita gente. Sabe plantar valor, tanto de bolacha dez por cento, como de uma mesa cheia, ou de uma terra cultivada, de um filho alimentado, de quem cuida da terra, de uma rendeira, da vida dessa rendeira e agricultora. E como diria Manoel de Barro, “Desaprender oito horas por dia ensina os princípios.”
Todo dia na terra, Genelicia faz a sua própria caminhada, renascença plantação, das linhas que a compõe. E a gente aprende que escutar coisas que importam, serenam o coração. Simples, assim: de cada pergunta que fazíamos, um silêncio e uma pequena resposta. Detalhe, princípios, profundidade, de como pegar na voz do vento ou da chuva. 10% da conversa já alimenta 90% de gratidão. E também de risada boa!
Da sala de entrada, fomos entrando em cada canto da casa, com um acontecimento diferente, um parto, um filho. Muitos cômodos construídos e uma parede no corredor completa de sorrisos, aniversários, enterros, encontros, e muitos rostos. Fotografias de gente, de família, de vida.
Nos levam pra cozinha e nos dois grandes bancos de madeira compridos, cabe todo o mundo sentado, se precisar. Uma mesa nos espera com café, pão, bolacha dez por cento…E as filhas e filhos conversando, tudo junto. Maria Genelicia fala baixo, sorriso aberto, olhar centrado, repara nos ditos e não ditos feitos na mesa da sua cozinha, enquanto fica sentada ao lado do fogão a lenha, ao longe, escutando. Para proteger a família de cobra, já até derrubou esse fogão, ficamos sabendo. E construiu de novo, sem questionar. Não ia permitir perigo de cobra, picar o seu rebanho de filhos e seu marido.
Assim, saímos falando de sua casa…falando do encontro, do gosto gostoso do xerém feito em fogão de lenha, do feijão, do aconchego, do tareco, do violão, das histórias, da cantoria que cria espaço de silêncio…desse silêncio que faz a gente escutar bem direitinho o segredo de um bom café, de uma mesa cheia, de uma conversa jogada fora, do tempo. Silêncio pra escutar mulher Genelicia, plantadeira e rendeira. Que faz a gente aprender qual o lado da noite que tem mais inutilidade, que não serve pra comprar nem pra vender, que tem mais utilidade é de gerar vida e alegria. Aprender que é preciso saber plantar, semear, cultivar pra colher e dividir, entre tantos.
As raízes da terra às vezes ficam secas, sem água, sem cuidado. Querendo cuidar delas, a gente compartilha, fica junto, se aquece. Sozinhos mesmo é ruim, casa grande é bom cheia! Assim, pra aprendermos a cuidar dessa plantação, somos convidadas para um jantar no outro dia, o vizinho também chega, e a gente pode escutar o violão do tio Seba com músicas que tocam corações do Nordeste a São Paulo, se esquentar com o calor do fogão ao lado da mesa, inventar mais histórias, contar dos tantos encontros vividos, aquecer outros lugares, com outras pessoas…
E pra casa dessa família, o anúncio na madeira: “Ao entrar/ traga alegria. / Ao sair / deixe saudades.” Combinado!
Narrativa
Era uma época de sacrifício
Nasci aqui mesmo, lá perto daquele sítio que eu falei a vocês, sítio Gangorra. Nasci no Gangorra, as águas não despeja pra lá e outros pra cá, né? é divisa, é Gangorra. Nasci (em casa) nesse tempo não tinha maternidade, não.
Só tinha dois (irmãos). Nasceram em casa também. Era mais nova. Mas eu fui criada, da casa que eu nasci pra casa que eu fui criada é bem pertim. É tudo na terra do meu avô, nesse sítio que eu digo, que hoje eu tenho ele lá. Era donde meu avô morava e eu fui criada lá. Aí depois que ele morreu foi passando de dono pra dono, né? E hoje eu fiquei com um pedacinho de terra, eu tomo conta dele.
Ave Maria, era uma época de sacrifício, minha mãe era no roçado, eu fui criada na casa do meu avô porque minha mãe não tinha tempo de cuidar d’eu. Quando ela tomou conta de mim eu tava com dez anos. Já tinha passado dez anos, porque ela era pobre, só vivia pelo roçado trabalhando.
A minha mãe era pobrezinha também que nem eu, ela lavava roupa de ganho, ela trabalhava na roça, linhavava pra ganhar dinheiro, só vivia nessa vida. Já fui criada nessa besteirinha e vou me acabar nela. Porque eu não tenho vontade de aprender mais nada na vida não.
Era uma casinha pobre, não tinha muito… ele (o avô) criou sete neto, dum filho dele que morreu, ele só vivia assim junto ao neto tudo. Vivia da agricultura.
Eu não brincava não, nóis não tinha direito de brincar não. E quando eu era pequenininha sabe o que é que nóis fazia? Tinha aquele sabugo de milho bem grande, a gente enrolava os bichin e fazia aquelas bonequinhas, ali era os brinquedo da gente, nós não tinha brinquedo que nem hoje em dia as criança tem, não é? Não tinha não. Não tinha brinquedo nenhum pra brincar não, não tinha diversão nenhuma não na vida, tudo pobre. Hoje em dia não, tem de tudo na vida pra pessoa, o mundo miorou muito, tá muito caro, muito difícil a vida, mas tem muita coisa. Tudo é mais fácil pra pessoa, mas um tempo atrás tudo era muito diferente.
Milho, feijão, momona, nessa vida, e de noite era na renascença
Logo cedo nove anos eu aprendi a trabalhar na renascença, aí fiquei trabalhando ajudando a minha mãe. Ela linhavava… Aí, depois eu me casei, me casei com 16 anos, fiquei morando na casa do meu avô, da casa do meu avô eu vim praqui. Aí foi que minha tia ficou de idade, ela era uma mulher, uma solteira, aí ficou de idade, não tinha mais com quem ficar aí eu trouxe ela, ela se acabou assim… passou cinco anos mais eu. Aí eu fiquei tomando lá da terra até eu hoje, faz trinta anos que eu tomo conta.
Meu pai era pobre, vivia trabalhando de ganho, assim de pedreiro, e eu mais minha irmã uma semana ia pro roçado uma e na outra minha irmã ficava cuidando em casa e quem ia era eu pro roçado, só ia trocando.
Milho, feijão, momona, nessa vida, e de noite era na renascença, candeeiro em cima de um frando assim, que era pávil nesse tempo tava ali pra trabalhar, pra sobreviver.
Quem ensinou a gente fazer renascença já morreu a muito tempo, era na rua, fumo pra rua, minha mãe botou numa casa lá, pra gente aprender, pra poder nós continuar fazendo. Nessa cidade de Poção mesmo.
Quem aprendeu foi minha irmã. Foi uma tia minha, a mulher de Sebastião, tia Joaninha, ela morava na rua. Aí ensinou a minha irmã e minha irmã me ensinou. De linhavar e essas coisas era minha mãe que ensinava. De tudo ela ensinou a gente a fazer. Foi de agricultura, nois sabia tudo, torrava café, tudo no mundo ela botava a gente pra fazer. Porque era pobre e ensinava, “é porque vocês não sabem com quem vocês vão se casarem com quem é que vocês vão viver, na vida já sabe de tudo”, ficava dizendo isso assim.
E do mesmo jeito eu criei meus fio, ele diz: “oe, mãe, passe ferro nessa roupa” eu digo “passo não que eu vou ajeitar e vocês passa” hoje eles lava passa tudo na vida deles.
Agora eu criei tudinho assim
Teve) Doze (filhos) só criou-se dez. Morreu um, esse que as meninas mostraro, e o aborto. E, quando foi agora morreu outro, tá com dois anos que morreu um. Veio de São Paulo. Meu marido quando foi com nove mês ele morreu… Ele veio de São Paulo só passou quatro mês vivo.
Ele soube que o pai tava doente e veio fazer uma visita, quando o pai morreu, quando foi com nove mês…
Sabe todos eles (trabalhar na roça), sabe assim trabalhar de pedreiro, serviço de casa eles sabe, o pai ensinou. Quando ele caiu na idade que não pude mais trabaiar aí ele queria que os menino queria fazer as coisa não sabia, ele sentava-se num tamburete e dizia: “oe, vá fazendo assim, assim…” eles aprenderam.
Tinha vez que eu ia pro roçado, oxe, com um buchão por acolá, passando baixo das cercas chega zuava quando eu passava. Eu ia pro roçado trabalhar.
Agora eu criei tudinho assim, não criei por casa de vizinho não. Se eu chegasse em casa faltasse um eu tinha que criar tudo na linha, e graça a Deus até a data de hoje, nunca me deram problema.
Chegava em casa se eu dissesse “cadê fulano?” e não tá, pois ele aparecia, mas assim pra eles tare em casa de vizinho, vadiando, não. Nunca mandei um filho vadiar nessa vida.
Nunca deixei nenhum passar necessidade
É por causa que é muito difícil, a pessoa dominar meio mundo de gente assim. Dizer assim, graça a Deus, “meu Deus”, eu digo, que não deu pra bandido nem pra certas coisas, né? Se eles tivessem uma queixa assim “ô, mãe, isso assim assim” era o pai e agora é eu “mãe, isso assim assim” eu digo: “pode deixar, eu resolvo”.
O que é que era difícil? Era muita coisa. Tinha vez que a gente, era um tempo ruim, que a gente colocava a comida na mesa e dizia: “deixa eles comer, o que sobrar nóis… se alimenta”. Tinha vez que ele dizia: “Eu vou no mato achar um passarinho” Aí ele chegava em casa eu partia aqueles pedacinhos botava cada cá em seu prato, pronto. Nós ia dormir satisfeito, tava todo mundo dormindo e nós também. Ave Maria, era um alívio grande, nera? Tinha vezes que a feira que a gente fazia na semana não dava eu dizia, deixa a água no fogo que eu vou na rua vê se eu acho dinheiro de um novelo de linha. E nunca deixei nenhum passar necessidade.
Eu só trabalhava no novelo de linha dos outros
Eu comecei a fazer depois que me aprumei uma coisinha, mas eu só trabalhava no novelo de linha dos outros. Aí depois eu fui me controlando, já depois quando tudinho casou, fui me controlando, fui comprando um novelinho de linha, fui comprando uma peça de lacê.
Eu às vezes vendia um bichinho, uma galinha, uma coisa, vou comprar uma peça de lacê, às vez um menino me dava. Eu buscava o serviço e vinha fazer aqui. Toda vida. Às vezes eu vendia na feira e às vezes eu vendia a eles mesmo, num sabe? (na feira). Depois da fábrica cabou.
Trabalhei muito praquele povo (de encomenda), mas nunca é como trabalhar pra gente não. Era um serviço apertado. Eu tinha que dá conta de roçado, dá conta de menino, e trabalhar em renda pra quando fosse no sábado pegar um tostãozinho pra ajudar em alguma coisa que o que o pai conseguia não dava. Não tirava nem dez conto. Era só uma ajuda. Comprava um par de sandália pra um menino, comprava um alimento que faltasse… Mas não dava pra fazer feira não.
Hoje se eu vender um servicinho que não tem mais quem venda, só dá mesmo pra comprar uma carne, ir feira de fruta, uma coisa porque o resultado é pouco. Por exemplo, se eu fosse fazer aqui mermo, eu trabalhando mermo nesse servicinho pequeno? é umas três semanas, porque eu trabalho na roça. Eu vendia um serviço desse por cem conto agora não tem quem queira mais, é cinquenta, sessenta. Adulo o povo pra comprar, se quiser comprar bem, se não quiser traz pra casa. Vendo lá em Poção.
Essa semana mesmo eu vendi uma barra de lençol de solteiro, vendi por cento e quarenta, é de você chorar, por causo que é muito serviço. É só pra entreter mesmo, uma coisinha. Elas (as filhas) tudinho sabe trabalhar (na renda renascença). Maurício (flho) trabalha bem.
O dia-a-dia é da roça pra renascença da renascença pra luta de casa
Estudei nada, eu só conheço o A somente, rapaz. Minha mãe me criou no roçado e eu me casei e continuei na mesma vida. Quarenta e nove anos (casada).
O dia é com todo mundo, mas de noite é sozinha. Tem dia que eu digo, mas porque é que eu vivo aqui mais, porque é eu sozinha. De dia eu não sei nem quanto sejam porque é um rebanho aqui, um entra e sai o outro entra e sai… Ave Maria, quando vem é uma festa é porque eles moram tudo longe.
O dia-a-dia é da roça pra renascença da renascença pra luta de casa. Planto milho, feijão. Isso é só pra dentro de casa mesmo, eu não tenho mais saúde pra trabalhar não, só pra entreter mermo.
A minha irmã foi quem aprendeu a trabalhar, aí depois ela me ensinou. Era os mesmos de hoje mesmo que eu faço, só tem diferente mesmo essas aranha, essas cianinhas, dois amarrado…
Ave Maria, ainda hoje eu gosto, se me tirar do serviço eu pego destino.
Não é fáci não as coisas que eu já passei na minha vida
Eu nunca fiz não, aniversário deles não (dos filhos). Eles crescero mas nós nunca tivemos condição de fazer não. Fazia assim alguma coisa quando ia batizar um, uma coisinha, as condições da gente era pouca pra fazer.
É, às vezes eu não sou assim de viver nas casa dos outros, não sou. Eu só sou de casa mermo, de viver dentro de casa mermo. Aí, quando eu tô bem aperriada da vida eu digo “vou ali na casa de fulano”. Que se não eu tô aqui trabalhando no meu serviço.
Já teve momento de eu trabalhar noite e dia porque não me chegava sono, eu digo, eu vou trabalhar pra não sair. Não é fáci não as coisas que eu já passei na minha vida. Ainda acho que Jesus me deu saúde e eu não pensava… Quando eu pego a pensar pego uma enxada, vou mimbora prum roçado, quando chego aqui já tem se passado. É isso mesmo…
Na renda, ou se não saio pro roçado, pronto, ontem mesmo eu tava meia nervosa “mãe, saia dessa chuva” eu “deixa eu na chuva”. Quando eu cheguei em casa tomei um banho e me deitei, pronto fiquei deitada.
Eu demorei uns três meses (numa renascença), por causo que é muita luta pra eu pra todos os serviços, né? Trabalhando… me impaiava nos roçado. De meio dia pra tarde tem dia que eu sento e trabalho a tarde todinha, no serviço. Porque era muito grande, era de dois metros, três metros, vendi por 200 e o outro por 140. Essa aqui é passadeira conforme seja as peças eu vendi essa daque de três peças vendia por cem, ta vendo? E pago o novelo de linha por trinta, fora o lacê, o lacê e a linha só o feito que a gente paga, né? Não fica nada, e depois dessa fábrica aí pronto, cabousse.
Eu vou te dizer, eu não tô achando é nada em Renascença, é só pra se distrair mesmo, mas futuro é pouco. Eu acho, acho muito importante, agora que tá saída de renda em Poção tá muito pouco, não tem não. Compra barato e vai vender longe, eles vende caríssimo. (da fábrica) Olha, eu nem sei te dizer, viu? Porque a pessoa só vê reclamação por casuo que trabalha muito e o pessoal vão vender longe.
Por um caminho certo eu dou um conselho a eles
Quando eles (os filhos) pegaram pra trabalhar era deles (o dinheiro), o pai nunca queria se um filho tivesse dez centavos no bolso e faltasse um quilo de açúcar, se eu fosse pedir eles se zangava “deixe eles com dinheiro dele, ele trabalhou pra ganhar o dinheiro dele, deixe ele com o dinheiro dele” aí a gente se virava de outro jeito, ainda hoje não pedimo, dá outro jeito.
Às vezes eles diz malcriação eu também digo a eles e assim vamo vivendo, mas nós nunca fiquemo diferentes. Esses filhos todinho, mas graça a Deus nenhum se criaro diferente uns com os outros não. Eu às vezes eu digo, eu não tenho dinheiro, eu não sei ler mas por um caminho certo eu dou um conselho a eles agora se quiserem tomar outros destinos tome, mas meu que eu dou é certo, né?
Eu só sei que foi umas mulher que vinheram pra ensinar ao povo
Sei não (da origem da renda renascença em Poção), eu só sei que foi umas mulher que vinheram pra ensinar ao povo, mas essa não existe mais não. Foi mesmo, foi Lala que ensinou, é uma mulher que… juntou o povo todinho pra ensinar. Aí depoise o povo foi aprendendo e ensinando aos outros, né? É que nem Pesqueira, Pesqueira tomou conta do serviço de Poção por causo que era Poção que fazia, aí Pesqueira também ficou.
Eu faço tudo, olhe, for de renascença, eu vou falar a verdade eu não tenho preguiça de nada na minha vida, faço com prazer na vida.
(de ser agricultora) Eu gosto, a minha profissão é essa, graças a Deus. (e de ser rendeira) Também. pode ter a riqueza maior do mundo, eu não tenho inveja de riqueza, tenho não. Eu me criei assim do jeito que sou mesmo. Às vez as meninas diz “mãe mãe, pra que… mãe se arrume, mãe” eu digo “pra quê eu vou me arrumar mais? não tem mais pra quê”, né?
(E cansa de fazer renda?) Aqui? nada. Só quando eu limpo mato que eu fico com as pernas doendo. Aí eu vou me assentar pra trabalhar os braços que tá sadio, elas mesma arreclamam “mãe, só vevi com esse serviço no colo” eu digo “eu tô com as minhas mãos sadia, as pernas tá doendo, eu tô trabalhando”
Nunca tive vida boa não, se eu for contar a minha vida é um livro
Nunca tive vida boa não, se eu for contar a minha vida é um livro. Hoje eu vejo eles criando os filho deles, com tudo quanto é de coisa, com tudo quanto é de luxo, eu fico satisfeita e alegre, por causo que eles não foram criados desse jeito, né? Porque eu não pude.
Às vezes eu pego assim a pensar, hoje se fosse hoje pra eu criar meus filho do jeito que eu criei eu não tinha mais coragem de criar. Assim, né? Porque hoje em dia é muita coisa.
Ave Maria, é a coragem que dá pra pessoa fazer. Se fosse pra eu morar numa cidade pra eu viver sentada trabalhando eu não tinha coragem não de viver não, não tenho inveja que aqui eu saio pra um canto saio pra outro. Já passei muita coisa na minha vida.
Eu vou lhe falar a verdade, o tempo pra trás da minha vida eu não tenho saudade de nada. Só tem do meu pai e da minha mãe, assim de essas coisas de festa, passeio, nunca tive na minha vida. Tem umas partes bem pra trás que não gosto nem de lembrar, das minhas coisas. Passei muita coisa na minha vida.
Mas de tudo, por tudo, o que eu achei ruim na minha vida foi viver sozinha. Não ter quem dê uma palavra, não é mole não a pessoa anoitecer assim.
Pode até melhorar
Eu tô achando assim, só se vinher mesmo uma força dada por Jesus, mas que aqui mesmo meori… Porque hoje em dia se você botar uma mocinha pra trabalhar em renascença “vai esse serviço aqui que te ajuda e tu ganha um real” “ah, isso não dá em nada não, não quero não, não tem mais valor não” e não tem mesmo não, né? Pra hoje em dia os gasto não dá pra nada. Pode até melhorar, Deus ajudar que melhore.
Deus dá a força da pessoa criar e o destino pra pessoa viver
(Sonho) Tenho mais não, cabousse. Cabousse meus prazer na vida. De primeira eu tinha uma vontade assim, olha, eu vou mimbora pra São Paulo, ponde tá meu filho… O meu prazer mesmo, tendo um feijão e um pedaço de carne pra eu comer pronto. Não tem vontade não, mas é o criar da pessoa mesmo, desse jeito né?
Eu vivo assim (de unha pintada), trabalhando na roça, aí de repente chega uma viage “mãe, vamo ali” aí eu vou danar um caco de telha nas unhas, vou danar pedra, não. Vou lavar, passar escova e fazer a unha, minha fia. Se um diz eu cair doente não faz tanta vergonha.
Ser mulher, eu não sei, eu tenho pra mim assim que uma mulher ela tem uma responsabilidade muito grande, pra ela, é quase que… a gente topa muita coisa na vida que não era… que a gente nunca esperava, né?
Aí o povo diz..
Minha riqueza na vida todinha tá nos meus filhos e mais nada porque o que a gente adquire tá espalhado com eles, não tenho assim prosperação de nada não, sabe o que nós trabalhamo foi somente pra criar os filhos da gente mesmo.
(Mulher rendeira) é do mesmo jeitinho. Quando eu era solteira eu dizia “oxente,um dia eu vou me casar preu sair dessa vida da agricultura” oxe, foi pior, mas graças a Deus eu tomei conta da minha casa e hoje eu tô vendo os filhos tudo criado. O mais velho tá com cinquenta anos.
Foi tudo aqui mermo em Poção,foi em casa e na maternidade de Poção. Só um que foi teve em Pesqueira, no hospital. Não teve cesárea, não. Tudo normal. Foi parteira, essa mais velha mesmo foi aqui em casa, esse resto tudinho.
Eu penso que é toda minha vida que tá aqui, né? Toda minha vida,meus filhos, todo sacrifício tá dentro dessa casa, tudo que eu passei ela sabe de tudo já. Guarda tudo isso.
Eu sei que a gente passa muita coisa na vida da pessoa, mas… é pesado a pessoa criar um rebanho de filho feito que nem eu criei todinho e hoje em dia ninguém quer mais, quer um dois três… Mas essa a vida da pessoa mesmo. Deus dá a força da pessoa criar e o destino pra pessoa viver, sem tanta perturbação na vida, mas se a gente for botar tudo na cabeça, pesa, não é?