Poção

Poção

por Clara Nogueira

11.268 habitantes(estimativa 2017, IBGE)
Área 199,74 Km²
Agreste Central de Pernambuco
244km do Recife
Localizada entre Pesqueira, São João do Tigre (Estado da Paraíba), Belo Jardim e Jataúba

A primeira construção de Poção foi uma casa de taipa coberta de palha, erguida próxima a um poço profundo. Daí o nome da cidade. Já foi povoado, vila e distrito, e, somente em 1953, quando enfim desmembrada de Pesqueira, tornou-se município.

Quando “Vila de Poção”, possuía cerca de 150 prédios, uma igreja e 4.500 moradores, localizada à margem direita do Riacho Gangorra, no alto da Serra do Acaí.

Para chegar na cidade, adentra-se na vizinha Pesqueira, onde se segue por uma estrada de asfalto. O percurso de cerca de 19 km revela o vai e vem de carros particulares que transportam moradores de cá pra lá. A estrada é margeada por vilarejos, sítios e serras que tocam o céu. Cercas de madeira de troncos finos que nos conectam com a paisagem rural, e com seus inúmeros tons de verde – espetáculo que acontece depois de seis anos de seca. Essa estrada é a única que conecta Poção a outros lugares, sendo sua localização como o fim da linha para quem chega e o começo da linha para quem sai.

Na entrada da cidade há uma escultura da procissão de Domingo de Ramos, e um letreiro tímido que diz “Poção”. Logo na entrada: fábricas, lojas e casas anunciam que a cidade foi o berço da Renda Renascença. Estamos no centro de Poção, conhecido como “rua”, com casa conjugadas com traços vernaculares, ruas de paralelo, calçadas estreitas. A praça da Igreja Matriz Nossa Senhora das Dores é a principal da cidade. Ao seu redor, encontram-se os principais serviços, comércios e instituições.

A cidade abriga a nascente do Rio Capibaribe, no Sítio Araçá, onde há algumas casas de taipa, fazendas, casas de farinha; existem sítios como o de Maria do Carmo, dona da terra onde brota, assim como suas roseiras, o rio que vai desaguar suas águas no mar do Recife. Do Carmo, como ela se apresentou a nós, nos guiou subindo uma serra por dentro da mata, que, regida pelo vento, emite o som do mar. O olho d´água, por sorte e ajuda do tempo, estava com água fresca, coisa que há muito tempo não acontecia por ali. Descemos a mata com a felicidade de ver, ouvir e beber as riquezas do pedaço de chão de Do Carmo.

O Cruzeiro de Poção revela uma história de dedicação religiosa na construção de um espaço, hoje muito conhecido por fiéis da igreja católica, e destino escolhido por muitos, principalmente na Semana Santa. O Frei Henrique Brooker, responsável pela fundação do lugar, é tão reverenciado na cidade que parece estar vivo. Em 1961, mandou murar de pedras os limites do Cruzeiro e norteou a construção de um verdadeiro santuário. Os elementos construídos, a sua localização e a vegetação fazem do Cruzeiro um lugar em que a contemplação se faz em silêncio. Durante o percurso por dentro do Cruzeiro, os passos da Via Sacra e mensagens escritas nos fazem pausar. No entorno do Cruzeiro, existem casas conjugadas que têm em suas fachadas coloridas nomes bíblicos, e um espaço onde se colocam velas quando acontece alguma procissão. A taxa de aluguel dessas casas e o valor cobrado pra entrar na propriedade mantém o Cruzeiro, que pertence à Igreja Católica. No Domingo de Ramos a cidade se enche de fiéis de todos os lugares, e o Cruzeiro é o principal destino.

Se despedindo de uma seca que já durava seis anos, Poção garoa em julho. Como faz frio, à noite a cidade, que já é pacata, se aquieta ainda mais. As casas são abrigos que protegem do vento gélido e onde se oferece um café quente e doce. Guarda além na nascente do Rio Capibaribe o posto de segundo lugar mais alto de Pernambuco.

Muitos de seus habitantes não moram na “rua”, ou seja, no centro da cidade. Moram em sítios próximos e só o acessam quando precisam dos serviços que ele oferece. A Feira livre semanal existe desde 1872, e é realizada aos sábados. Por conta da proximidade com o Estado vizinho, a Paraíba, havia um tráfego constante de mercadorias entre os dois estados. Os agricultores e criadores montam cedo suas barracas e vendem uma variedade imensa de frutas, hortaliças, raízes, animais, entre outras coisas.

Em Poção ficava a casa dos pais de Maria Pastora, interna do Convento de Santa Tereza em Olinda. Numa dessas idas para casa, em 1934, levou consigo uma peça de Renda Renascença que estava por terminar1. A curiosidade de Elza Medeiros (conhecida como Lála) pelo que Maria estava fazendo fez com que Maria lhe ensinasse alguns pontos, sob a condição de sigilo absoluto. A quebra do segredo por parte de Lála, findou na abertura de uma escola onde ela ensinava mulheres a fazer Renda Renascença. E assim, desse segredo revelado, nasceu o fazer da maioria das mulheres de Poção.

A Feira livre era a principal fonte de comércio de Renda Renascença, por sua proximidade com a Paraíba, a atividade se alastrou, e as rendeiras comercializavam diretamente com seus clientes. Havia centenas de rendeiras que vendiam nesta feira. O preço era tratado diretamente com elas, que tiravam dali o sustento de sua família. Hoje, depois da abertura das fábricas e por decisões que fogem à lógica, a feira livre com Renda Renascença não existe mais. Hoje, as que ainda vendem em meio à feira podem ser contadas nos dedos de uma mão. Existe, sim, uma feira de Renascença, e essa acontece na vizinha Pesqueira.

Pela falta de oportunidade de emprego em Poção, parte dos homens da cidade trabalham em colheitas e fazendas no interior de São Paulo e Minas Gerais. Passam meses fora e só retornam quando a colheita nessas cidades termina. As mulheres e homens que ficam se dedicam a trabalhos no comércio, nas instituições e na agricultura. As mulheres que se dedicam somente ao fazer da Renascença encontram hoje dificuldades imensas. Tanto quanto ao valor para custear os materiais quanto à concorrência com as fábricas instaladas na cidade, que a elas só sobram os serviços terceirizados da renda. Apesar disso, não há uma rua sequer em que não haja uma casa com mulher fazendo Renda Renascença. Com o salário médio mensal de 1,6 salários mínimos2, seus habitantes vão criando com dificuldades suas famílias. O que foi em outro momento o motivo de emancipação de Pesqueira, a atividade econômica local da Vila de Poção, hoje mantém mulheres com suas práticas sob uma condição de precarização, e o predomínio das produções termina por pertencer às fábricas.

1 Ver texto sobre Renda Renascença em Poção.
2 Fonte: IBGE, 2015.